Gesus ou Jenésio?
(Nova versão)
Dia desses,na feira-livre lá do bairro, à medida em que pendurava no varal sobre as pilhas
de hortifrutigranjeiros o cartaz com os preços daquele dia, um dos funcionários
da barraca apregoava o nome de cada espécie enfatizando sempre as letras que
poderiam gerar dúvidas e outras características do vegetal, como por exemplo,
“jiló, com jóta, direto de Jundiaí!”, conforme exclamou. O item seguinte foi
chuchu, “com dois ceagás, e que pode ser preparado em frigideira, sem chiadeira!”,
e, assim sucessivamente, passando pela vagem, “com gê, de gato!”; pela cenoura,
“com cê de coelho, que é quem mais gosta dela!”; e pelo quiabo, “com quê e quase
sem baba!”. Fiquei prestando atenção no jeito bem-humorado do feirante, achando
um barato como ele recorria à criatividade para mencionar, corretamente, o nome
de cada tipo de alimento à venda cuja grafia pudesse – e costuma -- gerar algum
tipo de confusão devido às semelhanças entre sons de letras diferentes. Percebi
que depois do quiabo seria apresentada outra delícia do dia-a-dia que, também,
faz as pessoas trocarem Gesus por Jenésio. Fiquei esperando para conferir como
ele iria se pronunciar; se, por acaso, também não tropeçaria, como pode ocorrer
com quem não tem tanta intimidade com a língua portuguesa, embora não parecesse,
mesmo, ser o caso dele. “Barriga preta, que lá em casa, para emagrecer, vira
até chá, com ceagá!" tascou, olhando-me. “Ah, não vale, como assim?”
protestei no ato, zombeteiro: “Não tente me convencer que, desta vez, você não
saberia se é com gê ou com jóta que se pronuncia o nome desta delícia!” O
camarada não perdeu a pose. Demonstrando que sabia, sim, senhor, e que estava
só (me) sacaneando, emendou, sem deixar o abacaxi por descacar: “Arrê, sei sim,
freguês, qual letra aparece no meio do
verdadeiro nome da ‘barriga preta’ aqui, que, por sinal, fica uma delícia
servida à milanesa! Mas milanesa com ésse, de suflê, e não zê, de zoeira, como
estou fazendo, mas que muita dona de casa que passa por aqui pensa que é!” . “Está
certo, nesta você me pegou, parabéns, colega, fazer feira assim é bem mais
divertido!”, comentei, já saindo com a
sacola cheia de jilós, de chuchus, de vagens, de cenouras, de quiabos, e, claro...
de barrigas pretas! “Sempre às ordens, patrão, e precisando de algo é só me
procurar: sou o Genésio!”, completou, estendendo-me a mão direita. “Mas como
meu nome sempre dá muita confusão, pode me tratar pelo sobrenome mesmo, grava
ai, este não tem como ninguém errar: é Jesus!”
Um comentário:
muito bom Marcelino, ótimo texto.
abs
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