segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Barulho d´água (De A a Z Lado B)

De A a Z (Lado B)
Caros amigos e leitores:
Publico, abaixo, nova lista indicativa para quem curte música brasileira de qualidade conferir e conhecer. São álbuns de vários estilos que eu tenho em meu tocador de MP3. De vez em quando, vou renovar as dicas e, a quem se interessar, posso informar onde comprar ou como baixar cada um destes álbuns.
1. Avarandado, Ana Salvagni
2. Bangüê, Ilana Volcov
3. Chão Encantado, Ricardo Anastácio
4. Do corpo à raiz, Ivan Vilela
5. Eu venho vagando no ar, Túlio Borges
6. Folia, Boca Livre
7. Gaita Ponto, Renato Borghetti
8. História da Música Caipira, Passoca
9. Interior, Florencia Bernales e Henry Burnett
10. Jasmineiro, Túlio Mourão
11. Katxerê, Kátia França
12. Língua de Trapo, Língua de Trapo (1982)
13. Mistura e manda, Paulo Moura
14. Na quadrada das águas perdidas, Elomar
15. O Nordeste de Lua, Elisa Paraíso
16. Papo de Passarim, Zé Renato e Renato Braz
17. Quanta, Gilberto Gil
18. Romaria, Renato Teixeira
19. Samba de Trem, Edvaldo Santana
20. Trampolim, Mônica Salmaso
21. Urobóro, Roberto Corrêa
22. Violão e outras dobras, Celso Adolfo

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Barulho d´água (De A a Z Lado A)

De A a Z (Lado A)

Caros amigos e leitores:Publico, abaixo, lista indicativa para quem curte música brasileira de qualidade conferir e conhecer. São álbuns de vários estilos que eu tenho em meu tocador de MP3. De vez em quando, vou renovar as dicas e, a quem se interessar, posso informar onde comprar ou como baixar cada um destes álbuns.
Amor Certinho, Roberto Guimarães e convidados
Bicicleta, Boca Livre
Casa de todo mundo, Mario Seve
Dança das rosas, Consuelo de Paula
EmCantos Geraes, Márcio Lott e convidados
Fulejo, Dércio Marques
Gereba convida, Gereba e convidadas
Histórias de cada canto, Tarumã
Interiores, Argonautas
Já tô te esperando, Edu Ribeiro
Kleiton e Kledir, Kleiton e Kledir, Minha História (1995)
Levante, Trio Carapiá
Meu Brasil Brasileiro, Choro das 3
Na paleta do pintor, Tânia Grinberg
Objeto Sonoro, Juarez Machado e Grupo Muda
Quando o canto é reza, Roberta Sá & Trio Madeira Brasil
Rosas para João, Renato Motha & Patrícia Lobato
Sabiá, Paula Santoro
Tocando para o Interior, Nailor Proveta
Unplugged, Gilberto Gil
Viva Elpídio, Oswaldinho e Marisa Viana
Xiló, Zé Modesto
Yamandu, Yamandu (Eldorado)
Zaparilha, Maurício Novaes

Barulho d´água (Mandinga)

Mandinga

Era um dia daqueles em que nada dá certo e resolveu ir até a encruzilhada para verificar se lá não haveria algum despacho preparado contra ele. E se houvesse a mandinga deveria ser das mais fortes, pois, já antes de sair de casa, o vidro de perfume, francês e legítimo, escapou-lhe das mãos e ploft!, espatifou-se no banheiro! Antes do almoço, no trabalho, o micro só travava, amarrando o expediente, que, ah, justamente às quintas-feiras, costuma ser ainda mais puxado. À hora da refeição, a gota d’água: o jiló, cozido na véspera pela esposa, azedara. Decidido, após engolir tudo às pressas, pegou o automóvel. Só para ir esgrimiu contra 13 quilômetros de caótico trânsito, 31 graus, sem direito ao mínimo bafejo, indicado em um enorme termômetro digital que fazia propaganda de banco. Mas estava resoluto para alcançar a encruza, lá dar uma bicuda de esquerda (conforme rezam as orientações contra macumbas), chutar sem dó o maldito ebó e, depois, sossegado, curtir uma tarde mais agradável, sem surpresas ou aporrinhações. Ainda bem antes de chegar ao local pretendido, entretanto, deparou-se com a placa “Obras, desvio!”. De novo grunhiu impropérios, agora dirigidos à mãe de alguém, mas parou ali mesmo e prosseguiu a pé. Alcançando, enfim, a encruzilhada, no local constatou: ao invés de galinha preta, velha vermelha, a foto dele dentro da boca amarrada do sapo, ou sortilégios de qualquer corrente maligna arrebentava em flor um ipê rosa! Ergueu as mãos para o céu, benzeu-se. Desfeita a cisma, beijou demoradamente a árvore e pensou até em se aliviar à sombra dela já que a comida mal mastigada pesava-lhe no estômago, o que só não fez porque julgou que seria uma heresia.
Pegou o caminho de volta até o carro, aliviado, embora seguisse lamentando ter deixado dentro do veiculo óculos contra sol e boné que o protegeriam daquele calor infernal de começo de novembro. Chegou meia hora depois ao automóvel, empapado de suor, com sede, mas dava graças a Deus por nada existir contra ele na encruzilhada. Para aumentar a própria felicidade, acabara de mijar, olimpicamente. Deu a partida para voltar à vaca fria assobiando os chorinhos que tocavam a bordo e sequer notou, repousando no parabrisa, o papel amarelo, cinco pontos na carteira de habilitação por ter estacionado atabalhoadamente em local proibido, quando, irritado, apeara do carro na altura do desvio.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Barulho d´água (Haicailinhas 2)


Haicailinhas 2 (atualização em 22 de julho de 2012)
Um dia destes comecei a buscar em caixas, gavetas e cedês fotos antigas para enriquecer meu álbum digital e, entre elas, resgatei também alguns textos e poemas, enre eles haicais, ou tercetos em forma de haicais. Nesta nova retranca para a série Haicailinhas estão alguns.
Marcelino Lima


Bem-me-quer, mal-me-quer.../O vento desfaz a nuvem/em forma de flor.
Como podes, gato,/divertir-se tanto assim/com um bago de uvas?
Grandes, amarelas./As pinhas da minha infância/não têm similares.
Rosa lá em cima./Lá embaixo, a molecada/esperando pinhas.
Quarenta caroços/E ainda está intacta/metade da pinha.
Buraco na parede,/ passa o ar, passa a luz .../...ai, ai de mim, menina!
Chuva violenta,/cairam árvores e telhas,/salvou-se a violeta.
Noite de geada —/recados de namorados/no vidro do carro.
Sol de inverno--/Uma calçada repleta,/outra vazia.
Passeio de férias –/Caminho nas ruas da infância/agora de sapatos.
Tudo fica quentinho/onde ela se deita --/gata do Jorginho.
Ah, que viagem! --/Ao descascar a laranja,/várias voltas ao mundo.
Estrelas e luas –/a noite, bem quentinha,/num prato de sopa.
Kombi da pamonha –/tudo quieto, de repente,/no prédio em obras.
Mangueira frondosa --/Com seus uis e ais,/prima maravilhosa!
Chuva passageira--/Flores de jacarandá/no dorso do cavalo.
Até meu destino/ainda tem muito chão -- Ah, pé de goiaba!
Troca na cidade./Leva milho, traz café/o carro de boi.
Os donos nem saíram,/mas os gatos já subiram --/e dormem na mesa!
Domingo de sol,/toda a família no gramado--/Doze pássaros pretos.
Na fonte da praça,/um mergulho, um vôo curto.../Bem-te-vi toma banho!
Chuva a caminho./Mesmo apertando os passos,/o vira-lata atrás.
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Estes estão postados no mural Grafitti, do portal Kakinet
Vaga-lume no quarto ­
Não fosse só de passagem,
apagaria o abajur.
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Primeiro no morro,
depois onde tomo brisa —
cai a noite na vila.

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Velho no farol
vendendo buquês de rosa ­
O sorriso é brinde.
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O gato se estica,
boceja, retoma o sono ­
Assim vai o domingo!
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Noite de saudades ­
de tanto acarinhá-la,
já desbota a foto.

Barulho d´água (Pulo de gato)

Pulo de gato

Disso eu nada entendo, sei fazer, não.
Tento é pelo prazer de experimentar.
Pelo desafio de descobrir como é durante.
De pegar as manhas arriscando.
É como meu pai dizia: a ciência das coisas
a gente aprende batendo prego e martelando o dedo,
ao serrar tocos sem molestar o nó da madeira,
danem-se os manuais e a geometria do espaço!

Barulho d´água (Sempre cantando...)

Sempre cantando
(momentos antes de a música rolar)

... então, o apresentador vai te chamar, você entra no palco soltando um gritinho tipo e ai galera?, esticando bem o ra de galera, agitando bem os braços, batendo palmas, no ritmo pá, pá, pá, dá uns pulinhos, sempre cantando, né, é cantando, não se preocupe com o quê, lindinha, a letra? não importa, tem de cantar, na verdade, nem precisa, não, basta simular, seguir o play-back, mímica de boca, certo? mas sempre naquele pique, entende? o que vale mesmo é na hora do refrão, o refrão vai estar na ponta da língua da platéia, desde o começo do programa a produção tá colocando o refrão no ar pro público já ir pegando, ai sim, na hora do refrão, então você se agita mais, canta junto, pra valer, lindinha, libera a adrenalina sem medo, olha bem pras câmeras: os caras vão te dar aqueles closes bem de rosto, enquanto você se apresenta vão alternar seu rosto, lindo rosto, hein? e umas imagens rápidas do cd, assim, bem estouradas na tela, você só segue puxando o refrão que no dia seguinte emplaca, vira sucesso, putz! todo mundo vai correr às lojas, pedir teu disco, vão falar assim lindinha, ó, é aquele que tem a música que aquela lindinha cantou ontem no programa da tv, dez, dez, você vai arrebentar de tanto vender, vai bombar, e ainda mais com este cabelo assim, vermelhão, a roupa também, tudo em cima, tudo a ver, nossa, é hoje que todo mundo fatura, ouviu? esta foi a primeira deixa, então, na terceira você vai, vai lá, firmeza, agita bem os braços, bate palmas, no pique, pá, pá, pá, lindinha, entende? sempre, sempre cantando...


17 de março de 2.004

Barulho d´água (Paraíso)

Paraíso

Já que morrer é inevitável,
ir para o céu uma possibilidade,
para que a eternidade seja menos enfadonha,
tomará que lá em cima tenha:
gente vendendo cândida pelas ruas
naquelas camionetas ou kombis estruchadas
rancho da pamonha e pastelaria de japonês,
parque de diversões, circo de um leão só,
teatro mambembe, terrenos baldios,
sem fios por perto, para soltar pipas,
melancia à vontade,
botecão para tomar umas brejas
campo de futebol para peladas.
Melhor ainda será se Deus
curtir música clássica, mas tolerar pagode,
for corintiano, e de vez em quando,
liberar as almas para ir ao Pacaembu ver o Timão,
se houver feriadão para uma pescadinha
(afinal, morto não é de ferro),
Se não for querer muito,
que também exista liberdade para amar à vontade,
mandar ao inferno quem nos encher o saco,
sem levar puxão de orelhas do Gabriel pelo impropério!

Barulho d´água (Palavras cruzadas)

Palavras cruzadas
Raul Bopp é autor de?
Cobra Norato
Sabe tudo. Elevação de Minas?
Serra da Canastra.
Serra da Canas... Certo, de novo! E o artilheiro do Brasil na Copa de 70?
Jairzinho.
Demais, deu, achei que fosse Rivelino, mas tem uma letra a menos...
Não, Rivelino é com dois "eles", tem nove letras, também, mas é Jairzinho, o Furacão.
Ta, já escrevi, agora e esta? fruto rubiáceo, típico das Antilhas, muito apreciado para licor...
Xi, nesta você me pegou, nem sei onde são as Antilhas. Começa com o quê?
Jota, de Jairzinho...
E quantas letras tem?
Uma, duas, três, oito... jabuticaba não dá, tem dez....
Acho que nunca ouvi falar, pule esta, deixa para o final, falta qual?
Mais da metade, ainda...
E ela cruza com qual?
Com Jairzinho, Canastra...
Passa...
Vou consultar o livro de frutas, quem sabe...
Não, não, o livro só tem frutas nordestinas, do Brasil.
É mesmo, puxa, sou mesmo muito lerda...
Nada disso, você só não estudou o suficiente...
É, muita enxada, mandioca para colher, roupa para lavar no rio, fazer o quê?
Dormir, dormir que já é tarde! Amanhã você acaba esta página. Quem sabe não sonha com o nome da fruta, hein?
É, quem sabe, mas prefiro sonhar com outra coisa. Que sou, por exemplo, uma bela atriz de Hollywood. E que nas palavras cruzadas há uma página na qual perguntam o nome da estrela do filme tal, ganhador do Oscar, euzinha, já pensou?
E eu? Seria quem?
O De Niro, o Redford...
Nossa, então, boa-noite! E se por acaso você sonhar, por favor, nem precisa acordar, viu, fica sonhando, nossa, fica sonhando...

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Barulho d´água (Lobo mau)

Lobo mau


Empunhando o tridente do rei Tritão (na verdade, um garfo de macarronada), arma poderosa e de fantásticos recursos contra os perigos do fundo do mar, da sala, do quarto, da cozinha, da casa inteira, a criança sentiu-se forte, dominou o medo. Azar do lobo mau, que enquanto batia e centrifugava roupas, uivando e tremendo, assustou-a.
Este texto está postado também no blog "Poesia feita em casa" (www.poesiafeitaemcasa.blogspot.com ), mas alinhado como uma sugestão de poema. Ilustra uma brincadeira do Jorge Henrique quando ele tinha entre três e quatro anos e resolveu enfrentar a máquina de lavar que antes o assustava sempre que começava a chacoalhante etapa de secar roupas...

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Barulho d´água (Haicailinhas 2)

Haicailinhas 2


Um dia destes comecei a buscar em caixas, gavetas e cedês fotos antigas para enriquecer meu álbum digital e, entre elas, resgatei também alguns textos e poemas, enre eles haicais, ou tercetos em forma de haicais. Nesta nova retranca para a série Haicailinhas estão alguns.

Marcelino Lima

Grandes, amarelas./As pinhas da minha infância/não têm similares.
Rosa lá em cima./Lá embaixo, a molecada/esperando pinhas.
Quarenta caroços/E ainda está intacta/metade da pinha.
Buraco na parede,/ passa o ar, passa a luz .../...ai, ai de mim, menina!
Chuva violenta,/cairam árvores e telhas,/salvou-se a violeta.
Noite de geada —/recados de namorados/no vidro do carro.
Sol de inverno--/Uma calçada repleta,/outra vazia.
Passeio de férias –/Caminho nas ruas da infância/agora de sapatos.
Tudo fica quentinho/onde ela se deita --/gata do Jorginho.
Ah, que viagem! --/Ao descascar a laranja,/várias voltas ao mundo.
Estrelas e luas –/a noite, bem quentinha,/num prato de sopa.
Kombi da pamonha –/tudo quieto, de repente,/no prédio em obras.
Mangueira frondosa --/Com seus uis e ais,/prima maravilhosa!
Chuva passageira--/Flores de jacarandá/no dorso do cavalo.
Até meu destino/ainda tem muito chão -- Ah, pé de goiaba!
Troca na cidade./Leva milho, traz café/o carro de boi.
Os donos nem saíram,/mas os gatos já subiram --/e dormem na mesa!
Domingo de sol,/toda a família no gramado--/Doze pássaros pretos.
Na fonte da praça,/um mergulho, um vôo curto.../Bem-te-vi toma banho!
Chuva a caminho./Mesmo apertando os passos,/o vira-lata atrás.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Barulho d´água (O trio)


O trio

Três amigos que dormem numa das praças da cidade dividiam o morno sol das primeiras horas de uma nova manhã, mais um cigarro, enquanto comentavam o resultado do clássico disputado na noite anterior, estampado na manchete do diário esportivo "Na gaveta". O time de um deles vencera o arquirrival após uma épica contenda e este, exultante, comentava a jogada e o golaço que decidiu o acirrado duelo, já aos 48' da etapa final, autêntica pintura do craque da camisa 10 cuja foto ocupava seis colunas da primeira página. Após uma pausa, comentou em tom melancólico que teria sido tão bom de bola quanto o ídolo e brilharia nos gramados caso não sofresse uma fatídica contusão reponsável por afastá-lo das quatro linhas quando ainda era sub 20. Ao notar que os dois parceiros não embarcaram na prosa, levantou a barra da calça da perna esquerda, e na canela, revelou-se uma extensa cicatriz. "Olhem a cirurgia que precisei fazer logo após a entrada daquele zagueirão carniceiro, o Juvenal Scania! O cara me impediu de seguir jogando bola, de virar estrela e ter fama, desgraçado! Depois daquela entrada criminosa e várias operações, acabei chutado para escanteio pela cartolada e, foi assim, inconformado, que perdi o rumo nesta porra de vida!", disse, compungido. "Xi, ainda deve ser o efeito das pingas que tomamos ontem!", comentou o da ponta-direita, tabelando olhares zombeteiros com o colega. "Mas ontem não tomamos nenhuma, justamente para assitirmos ao jogo bem!", o ponteiro oposto emendou, esboçando um riso de trivela. Então, o primeiro, sem deixar pingar, arrematou: "Está explicado, então! O mano está sóbrio demais e, como só fica bem mamado, até já delira! O melhor é irmos logo procurar um cafézinho ou, daqui a pouco, ele estará pensando que é o Negão. E que nós somos o Riva e o Tostão!".
 


 
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Nota do autor: O braço do jogador cujo rosto não está visível, colado nas costas do Rei, é o meu e fui eu quem deu o passe para ele marcar!

domingo, 19 de setembro de 2010

Barulho d'água (A chegada da Primavera)


Festa na aldeia
(A chegada da Primavera)
Texto e foto: Marcelino Lima


Além dos muros do templo o Sol, quando vai caindo a noite, transforma-se em um disco perfeitamente redondo, de cores vibrantes que moram entre o laranja e o vermelho. Esta configuração celeste, típica da chegada da Primavera, é um sinal para que as crianças saiam das cabanas e nas praças coletivas das respectivas aldeias levem seus dragões para brincar. Os mais velhos trocam presentes como carpas, bonsais, garrafinhas de saquê, motis de folhas de sakura ou de hortência, cortes de finíssima seda para elegantes quiomonos vesti-los nas mais variadas ocasiões, incluindo a passagem para além do sagrado Fuji. Os mais jovens, chegando à mocidade, encontram seus pares, e ali mesmo muitos enlaçam o futuro e inauguram novas familias. Quando a Lua assume o firmamento e o brilho dela espalha-se entre as ruas, iluminando até mesmo o vão entre as pedras do calçamento, toda a comunidade já está em júbilo. Começa, então, o festival de pipas, cuja primazia cabe ao patriarca, orgulhosamente observado pelo caçula dos netos. A pandorga do garoto, estampada com o rosto de um samurai e confeccionada com varetas de jade, sobe em seguida, levada ao firmamento por um invísivel fio de prata, alinha-se à do avô e entre todas as demais. A noite torna-se multicolorida e ainda mais bela a cada novo fogo de artíficio que explode, desenhando crisântemos e gérberas no horizonte. Em silêncio, enquanto dura a celebração, origamis desabrocham e as estrelas, em perfeita harmonia, uma a uma, tornam-se haicais...

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

A pelada e os bolos (Barulho d'água)


A "pelada" e os bolos
Foto e texto: Marcelino Lima


Tarde de domingo. Por um instante me divido entre os bolos de minha mãe e a vontade de marcar mais alguns gols. De camarote, fico na torcida, observando o campo da janela da cozinha. À medida em que o cheiro de baunilha se espalha pelo ar, meu time sofre sem pontaria, tem um goleiro horrível, toma chapéu, bola entre as "canetas", erra passe de dois metros, o adversário vai construindo a goleada sem dó contra o bando de perebas que mal sabe cobrar um lateral. Ao final do primeiro tempo, peço dois pedaços. Estão ainda fumegantes, queimo a língua, mas os como correndo: preciso me apressar antes que a bola volte a rolar. Em mais 45 minutos terei de salvar a pátria, então faço o sinal da cruz ao pisar no gramado e entro na "pelada" confiante: vou virar placar enquanto o bolo de laranja que estará assando no forno fica no ponto...

Barulho d'água (A dança do lírio)


A dança do lírio
Um grão de pólen, após percorrer longo caminho soprado pelo ar, escolheu fecundar um lírio. Dizem abelhas, besouros e borboletas, com o testemunho de um bem-te-vi, que teria pousado dançando. Talvez por isso a flor amarela agora balance para lá e para cá, para lá e para cá, graciosamente, mesmo quando não há vento...

quarta-feira, 23 de junho de 2010

terça-feira, 22 de junho de 2010

Barulho d'água (Casa antiga)

Casa antiga
Casa de arquitetura antiga, pintada de branco, resistindo às transformações do bairro em desenvolvimento. Apenas mais uma parede para quem pressionou a válvula do spray.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Barulho d'água (Haicalinhas 16/04/2010)

Haicailinhas
(Atualização em 14 de junho de 2010)
1)Bate a ventania -- /a sacolinha de plástico,/tal qual uma garça.
2)Cinco contra cinco,/chinelos servindo de traves. /E todos descalços.
3) Chuva passageira. /Sob o toldo do botequim, /o cavalo espera.
4) Entardecer. /Sombras reproduzem no muro/ as flores de manacá.
5) Ondas no lago/ -- Uma folha de eucalipto/ é a prancha do inseto.
6) Noite de saudades. /De tanto acariciá-la, /já desbota a foto.
7) Dentro do arco-íris, /entre as letras do teu nome, /há a oitava cor.
8) Caixote de morangos. /Enquanto não vem o ônibus, /um banco improvisado.
9) Extrato bancário. /Dobrado como balão chinês /o saldo negativo.
10) Chuva repentina. /O motorista, gentil, /pára fora do ponto.
11)Nada a vista. /Até o prédio mais alto/ a neblina engole.
12) Vestido vermelho./A neblina não esconde/ a moça pelo caminho.
13) Um varal sem roupas,/duas dúzias de pregadores,/três ou quatro estrelas...
14) A pele de Rosa, /ainda, na minha pele./Pousa uma abelha.
15) Cortina amarela. /Mesmo em dias de chuva, /tem sol na sala.
16) Pausa no trabalho. /Após a chuva da tardinha, /um arco-íris.
17) Cheiro de pipoca,/fila à saída do colégio. /A minha sem bacon.
18) Armazém de vila, /à venda quase de tudo. /Menos o canário.
19) Um dente-de-leão./O páraquedas ascende/ao invés de cair.
20) Água na boca:/um caminhão repleto/da fruta que sorri.
21) Amor e romã. /Vem despindo as cascas/o melhor de ambos.
22) Ao final do dia, /o carro todo manchado --/Ah, joão-de-barro...
23) Produtos de limpeza -- /O arco-íris, em garrafas,/passeia de kombi.
24) Expostos ao sol/os caquis, de tão aquecidos,/queimam as retinas.
25) Mutuca das grandes/provoca banzé na sala/e ninguém vê o gol!
26)Um cavalo branco./De relance, o poente/baixando atrás do dorso.
27) Meio da viagem,/remota cidadezinha --/a unha da lua.
28) Noite de São Pedro./Dezenas brilham sem parar,/uma pinga ao singrar...
29) Trilha do parque-- A casinha das saúvas/é o Monte Fuji.
30) Lentamente, o cão/que havia nas nuvens/vira algodão.
31) Outra vez aqui/e, agora, de novo--/Flores de hibisco.
32) Em um dos pés do jardim/as romãs, neste ano,/ vestiram-se de joaninhas.
33) Entre girassóis/uma rústica plaqueta--/"Avenida Brasil"
34) Os olhos do gato,/os faróis do carro--/as luzes se beijam.
35) Banca de caquis --/Estarei ouvindo chorar/meu distante regato?
36) O ônibus não vem./A moça divide o frio/ com o cão sem dono.
37) Ora vazio, ora cheio/O ônibus vai e volta/você inda não veio...
38) Beijo inesperado/Perco o medo de altura/vendo tudo das estrelas...
39)A fogueira estala --/fica ao alcance da mão/ um punhado de estrelas.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Barulho d'água (Haicalinhas 01/04/2010)


Haicailinhas

(atualização em 1º de abril de 2010)

1)Bate a ventania -- /a sacolinha de plástico,/tal qual uma garça.
2)Cinco contra cinco,/chinelos servindo de traves. /E todos descalços.
3) Chuva passageira. /Sob o toldo do botequim, /o cavalo espera.
4) Entardecer. /Sombras reproduzem no muro/ as flores de manacá.
5) Ondas no lago/ -- Uma folha de eucalipto/ é a prancha do inseto.
6) Noite de saudades. /De tanto acariciá-la, /já desbota a foto.
7) Dentro do arco-íris, /entre as letras do teu nome, /há a oitava cor.
8) Caixote de morangos. /Enquanto não vem o ônibus, /um banco improvisado.
9) Extrato bancário. /Dobrado como balão chinês, /o saldo negativo.
10) Chuva repentina. /O motorista, gentil, /pára fora do ponto.
11)Nada a vista. /Até o prédio mais alto/ a neblina engole.
12) Vestido vermelho./A neblina não esconde/ a moça pelo caminho.
13) Um varal sem roupas,/duas dúzias de pregadores/três ou quatro estrelas...
14) A pele de Rosa, /ainda, na minha pele./Pousa uma abelha.
15) Cortina amarela. /Mesmo em dias de chuva, /tem sol na sala.
16) Pausa no trabalho. /Após a chuva da tardinha, /um arco-íris.
17) Cheiro de pipoca,/fila à saída do colégio. /A minha sem bacon.
18) Armazém de vila, /à venda quase de tudo. /Menos o canário.
19) Um dente-de-leão./O pára-quedas ascende/ao invés de cair.
20) Água na boca:/um caminhão repleto/da fruta que sorri.
21) Amor e romã. /Vem despindo as cascas/o melhor de ambos.
22) Ao final do dia, /o carro todo manchado --/Ah, joão-de-barro..
.23) Produtos de limpeza -- /O arco-íris, em garrafas,/passeia de kombi.
24) Expostos ao sol/os caquis, de tão aquecidos,/queimam as retinas.
25) Mutuca das grandes/provoca banzé na sala/e ninguém vê o gol!26)
Um cavalo branco./De relance, o poente/baixando atrás do dorso.
27) Meio da viagem,/remota cidadezinha./A unha da lua.
28) Noite de São Pedro./Dezenas brilham sem parar,/uma pinga ao singrar...
29) Trilha do parque-- A casinha das saúvas/é o Monte Fuji.
30) Lentamente, o cão/que havia nas nuvens/vira algodão.
31) Outra vez aqui/e, agora, de novo--/Flores de hibisco.
32) Em um dos pés do jardim/as romãs, neste ano,/ vestiram-se de joaninhas.
33) Entre girassóis/uma rústica plaqueta--/"Avenida Brasil"
34) Os olhos do gato,/os faróis do carro--/as luzes se beijam.
35) Banca de caquis --/Estarei ouvindo chorar/meu distante regato?
36) O ônibus não vem./A moça divide o frio/ com o cão sem dono.

Barulho d'água (Três origamis)

Três origamis

Ao cair da tarde, o rapaz fez uma pausa no expediente. Estava ficando cansado, precisava de um intervalo, um breve passatempo até recobrar o fôlego. Havia na estante da sala revistas velhas entre as quais selecionou uma, retirando dela as três páginas que julgou as mais coloridas. A primeira, dobrada pacientemente, saiu lépida dos dedos dele, borboleta graciosa e leve. O beija-flor que surgiu em seguida tão logo sentiu as asas seguiu a trilha da dobradura anterior. Com um pouco mais de dificuldade para o arremate, da terceira folha nasceu uma abelha. Ávido em polinizar, o inseto também decolou. Enfim refeito, o rapaz voltou à lida, havia ainda pilhas de textos para serem editados. Na mesa ao lado, entre espantada e surpresa, a colega de trabalho deixara de digitar, ria ao ver três origamis pousando nos ombros dela atraídos pela flor de veludo que usava presa ao colar...

sexta-feira, 26 de março de 2010

Barulho d'água (O tigre e a andorinha)

O tigre e a andorinha
(Para Vivian Avellar)


Em uma das mãos abrigava um tigre, na outra, uma andorinha. Fechou-as, cruzou-as sobre os punhos, propôs um jogo à amiga: escolhe andorinha ou tigre? Ela escolheu o felino. Ao ser aberta a mão direita, no semblante dela se desenhou uma ponta de decepção. “Você pode não estar vendo o tigre por que ele tem algumas listras no dorso não muito bem definidas, mas poderá contemplá-lo por outro ângulo”, disse o rapaz. “Note que os olhos têm o brilho de mil tochas acesas, e, coragem, pode tocá-lo, acaricie-o e sentirás que o pelo dele tem a suavidade da mais nobre seda oriental”, prosseguiu. “Este animal é especial, faz parte de uma espécie já quase extinta, que tem hábitos solitários e costuma habitar as escarpas geladas do Himalaia. Os aldeões, inclusive, atribuem ao gato poderes. Agora mesmo, por exemplo, é possível que esteja invisível para que não seja incomodado e possa manter-se em sua quietude habitual, meditando. Ou, como também tem a agilidade das panteras, mais a leveza das andorinhas, pode simplesmente ter batido asas e voado para o pé da montanha.” Ela balançou a cabeça levemente, sorriu ligeiramente, concordou por diplomacia. Mais tarde, saindo à varanda, encontrou pegadas de um grande animal e flocos de neve. No beiral uma andorinha contemplava o sol caindo no horizonte.
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terça-feira, 23 de março de 2010

Barulho d'água (Piada)

Piada
Hoje aprendi mais uma: um verdadeiro amigo ri da piada que você conta para não deixá-lo em situação desconfortável, mesmo que ela tenha sido mal contada, ele não a entenda ou a anedota seja ruim, mesmo. O contrário também é verdadeiro. Um inimigo, nem sempre declarado, é capaz até de espalhar que você é um péssimo piadista só para vê-lo sendo repartido pelas feras, ou tomando malho em um paredão. E depois de ter rido ao ouvi-lo contar qualquer uma...

sexta-feira, 19 de março de 2010

Barulho d'água (Quem não tem cão...)

Quem não tem cão...

Improvisar é a capacidade de não deixar para amanhã o que não pode ser feito hoje.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Barulho d'água (Rosas para João)

Rosas para João



Fecha o tempo no sertão
É chuva vindo –
Um rai cai, um clarão

Os versos acima são os três primeiros da música “Haicai Baião”, que os mineiros Renato Motha e Patrícia Lobato gravaram no álbum “Rosas para João”, integrante do catálogo da gravadora “Sonhos e Sons”, em homenagem ao escritor conterrâneo João Guimarães Rosa. A letra é premiada como melhor do Festival da TV Cultura 2005. O disco é uma mostra do talento de ambos, que cantam juntos também em outros trabalhos de rara beleza, um dos quais passeiam por poemas de Fernando Pessoa, intitulado “Dois em Pessoa”. A carreira- solo de Renato Motha também tem obras que valem a pena comprar em boas lojas ou diretamente na gravadora (
www.sonhosesons.com.br), Destaco “Trilha das mãos” (1999), instrumental, e “Amarelo” (1999), mas quem adquirir “Todo” ou “Caixa de Sonhos”, entre outros, também não vai se arrepender. Veja abaixo a letra completa de “Haicai Baião”, formada por três haicais, compre o disco e encontrar um linque disponível ouça Renato e Patrícia cantando a música na edição de 9 de março do programa “Sr.Brasil”, que Rolando Boldrin apresenta na TV Cultura

Fecha o tempo no sertão
É chuva vindo
Um rai cai, um clarão

Trovão e tambor
No céu, no roçado zabumbam
O santo baxô

Manhã de água e cor
Até do outro lado do mundo
O chão fulorô

terça-feira, 16 de março de 2010

Barulho d'água (Haicalinhas 16/03/2010)

Haicailinhas
(atualização em 16 de março de 2010)
1)Bate a ventania -- /a sacolinha de plástico,/tal qual uma garça.
2)Cinco contra cinco,/chinelos servindo de traves. /E todos descalços.
3) Chuva passageira. /Sob o toldo do botequim, /o cavalo espera.
4) Entardecer. /Sombras reproduzem no muro/ as flores de manacá.
5) Ondas no lago/ -- Uma folha de eucalipto/ é a prancha do inseto.
6) Noite de saudades. /De tanto acariciá-la, /já desbota a foto.
7) Dentro do arco-íris, /entre as letras do teu nome, /há a oitava cor.
8) Caixote de morangos. /Enquanto não vem o ônibus, /um banco improvisado.
9) Extrato bancário. /Dobrado como balão chinês, /o saldo negativo.
10) Chuva repentina. /O motorista, gentil, /pára fora do ponto.
11)Nada a vista. /Até o prédio mais alto/ a neblina engole.
12) Vestido vermelho./A neblina não esconde/ a moça pelo caminho.
13) Um varal sem roupas,/duas dúzias de pregadores/três ou quatro estrelas...
14) A pele de Rosa, /ainda, na minha pele./Pousa uma abelha.
15) Cortina amarela. /Mesmo em dias de chuva, /tem sol na sala.
16) Pausa no trabalho. /Após a chuva da tardinha, /um arco-íris.
17) Cheiro de pipoca,/fila à saída do colégio. /A minha sem bacon.
18) Armazém de vila, /à venda quase de tudo. /Menos o canário.
19) Um dente-de-leão./O pára-quedas ascende/ao invés de cair.
20) Água na boca:/um caminhão repleto/da fruta que sorri.
21) Amor e romã. /Vem despindo as cascas/o melhor de ambos.
22) Ao final do dia, /o carro todo manchado --/Ah, joão-de-barro...
23) Produtos de limpeza -- /O arco-íris, em garrafas,/passeia de kombi.
24) Expostos ao sol/os caquis, de tão aquecidos,/queimam as retinas.
25) Mutuca das grandes/provoca banzé na sala/e ninguém vê o gol!
26) Um cavalo branco./De relance, o poente,/Baixa atrás do dorso.
27) Meio da viagem,/remota cidadezinha./A unha da lua.
28) Noite de São Pedro./Dezenas brilham sem parar,/uma pinga ao singrar...
29) Trilha do parque-- A casinha das saúvas/é o Monte Fuji.
30) Lentamente, o cão/que havia nas nuvens/vira algodão.
31) Outra vez aqui/e, agora, de novo--/Flores de hibisco.
32) Em um dos pés do jardim/as romãs, neste ano,/ vestiram-se de joaninhas.
33) Entre girassóis/uma rústica plaqueta--/"Avenida Brasil"
34) Os olhos do gato,/os faróis do carro--/as luzes se beijam.
35) Banca de caquis --/Estarei ouvindo chorar/meu distante regato?

sábado, 6 de março de 2010

Barulho d'água (Beija-flor risonho)

Beija-flor risonho
O beija-flor, que há tempos não vinha, deu hoje o ar da graça, de novo, encheu de graça o ar. E justo quando não havia néctar na garrafinha dele, entornada pelos ventos que andam açoitando, ajudando a secar as roupas. As formigas serviram-se do doce que melou o piso -- no muro pelo qual a mistura escorreu deu até lesma. De volta o colibri, quem primeiro percebeu foram os gatos. Um deles saltou do sofá no qual puxava a palha, um piscar de olhos depois já estava na varanda. Miava desafinado, ainda sonolento, nem sequer a um filhote de camundongo assustaria. Tive a impressão de que o beija-flor, pousado no varal, ria...

Barulho d'água (Cochilo)

Cochilo
Vem por ai um bando de patos. Ainda ao longe, deles ouve-se os granares. Por aqui, o cão, adormecido, ergue a orelha direita. Espreguiça-se -- as pernas traseiras vão lá trás. E volta a se fazer de morto.

Três ou mais linhas de prosa... e de poesia


O velho lago
mergulha a rã--
barulho d´água.

Este blog, cujo nome deriva do haicai de Matsuo Bashô, tem por objetivo a divulgação de crônicas e outros gêneros literários de minha autoria -- consulte também
http://www.poesiafeitaemcasa.blogspot.com e http://www.karumi.nafoto.net, outros trabalhos que assino. A cópia e reprodução dos elementos aqui contidos sem a devida autorização, por escrito, e sem estarem negociados direitos autorais e outras questões comerciais, sujeitarão o infrator a entendimentos com a lei.

Marcelino Lima



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