segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Barulho d'água (Haicailinhas 2)

Haicailinhas 2 (atualização em 3 de dezembro de 2012)

Um dia destes comecei a buscar em caixas, gavetas e cedês fotos antigas para enriquecer meu álbum digital e, entre elas, resgatei também alguns textos e poemas, enre eles haicais, ou tercetos em forma de haicais. Nesta nova retranca para a série Haicailinhas estão alguns.

Marcelino Lima
 
 
Toca nove vezes/O sino da capelinha --/O trem responde três.
Na quarta volta/já são três sapos cantando/na segunda curva.
Manhã de outono –/há três dias no varal,/o tênis pingando água...
Casa branca,/batentes azuis./À porta, marimbondos!
Casinha na periferia,/cana em ponto de corte/gatos no quintal...
Andorinha, andorinha:/mesmo não sendo feriado/vou passear à toa!
Em toda a casa,/só a cama dessarumada--/gatinha nas cobertas.
Ao colo do pintor,/o gato segue com os olhos/o vaivém do pincel.
Tarde de verão --/entre o voo de dois pardais,/ecoa um trovão.
Tarde chuvosa --/aos trovões misturam-se/sons de uma serraria.
Tarde chuvosa --/na rodovia, lá longe,/acendem-se as luminárias
Caixote de peras/com alguns cortes e tintas/casinha de tuim 
Em papel rosado/prediz um novo amor/a ave do realejo
De varal em varal/o cambacica vai pulando/até chegar ao néctar.
De cordão invísivel,/e pingente de estrela,/O colar da lua...
Sopa de estrelas--/cortado como a lua,/O pão que acompanha.
Uma folha cai--/à luz do sol, amarela,/quando gira, verde..
Vão aonde eu vou/não contam nada a ninguém--/ah, meus sapatos...
Meu velho sapato--/ainda guarda segredos/e não erra caminhos.
Em sonho, voo/ e, nos fios elétricos,/brotam cerejeiras.
Bem-me-quer, mal-me-quer.../o vento desfaz a nuvem/em forma de flor.
Prendedores coloridos,/roupas secando ao sol./Pousa um beija-flor!
Morro de Lindóia --/Parecem feitas de pedras/ as vacas brancas que pastam.
Chegada à Jaguriúna--/Boi que não está na linha./Segue o trem.
Carro do queijo/para provar não paga./E pode ser com doce. 
Como podes, gato,/divertir-se tanto assim/com um bago de uvas?
Clarão ao longe/leve batuque na janela--/ai vem chuva boa!
Grandes, amarelas./As pinhas da minha infância/não têm similares.
Rosa lá em cima./Lá embaixo, a molecada/esperando pinhas.
Quarenta caroços/e ainda está intacta/metade da pinha.
Buraco na parede,/ passa o ar, passa a luz .../...ai, ai de mim, menina!
Chuva violenta,/entre galhos e fios caídos,/salvou-se a violeta.
Noite de geada —/recados de namorados/no vidro do carro.
Sol de inverno--/Uma calçada repleta,/outra vazia.
Passeio de férias –/Caminho nas ruas da infância/agora de sapatos.
Tudo fica quentinho/onde ela se deita --/gata do Jorginho.
Ah, que viagem! --/ao descascar a laranja,/várias voltas ao mundo.
Estrelas e luas –/a noite, bem quentinhas,/num prato de sopa.
Kombi da pamonha –/tudo quieto, de repente,/no prédio em obras.
Mangueira frondosa --/com seus uis e ais,/prima maravilhosa!
Chuva passageira--/flores de jacarandá/no dorso do cavalo.
Até meu destino/ainda tem muito chão/ -- Ah, pé de goiaba!
Troca na cidade --/leva milho, traz café,/o carro de boi.
Os donos nem saíram,/mas os gatos já subiram --/e dormem na mesa!
Domingo de sol,/toda a família no gramado--/bando de pássaros pretos.
Na fonte da praça,/um mergulho, um voo curto.../bem-te-vi toma banho!
Chuva a caminho./Mesmo apertando os passos,/o vira-lata atrás.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Barulho d'água (Amém!!!)


Amém!!!
 
Já te disse, querida amiga: a resposta não sei...
Jamais a saberei.
Talvez por bastarem apenas míseros três minutos ao teu lado
para que nunca mais quem os experimente seja o mesmo.

Talvez, assim mesmo, piegas, seja pelo brilho dos teus olhos!
Ou pelos teus lábios que só exclamam risos, largos e sonoros,
Palavras doces de uma fêmea que, sim, saberia como ser fatal,
Embora dócil, sem nunca ferir...
 
Talvez seja pela tonalidade de tua pele, mistura de raças em um único corpo.
Talvez seja por esta cabeça de mulher avançada e madura,
Aberta, mas que conserva em si uma aparentemente frágil e brincalhona menina.
Talvez seja pelas tuas nádegas, ou seios, ou pêlos, ou pintas, ou pernas.
Ou sei lá: seria por tudo aquilo que guardas de mais recôndito e que,
Até hoje, eu apenas imaginei e provei com os olhos?

Sim, talvez, pois apenas sei que a curto de várias maneiras!
Então que assim seja, imortal, ainda que eu morra...
E infinito mesmo que eu não dure...
 
Amém!!!

domingo, 25 de novembro de 2012

O amigo ideal (Barulho d'água)

O amigo ideal

 
Está sempre pronto para nos contar fantásticas histórias.
Ou, em silêncio, narrar aos nossos olhos fatos verdadeiros,
 
 
seja em prosa, seja em versos.
Como professor ou como pai, também nos ensina toda forma de conhecimento.
É o amigo ideal tanto para as horas solitárias,
quanto para os momentos nos quais se quer estar solitário.
Dia ou noite, tanto faz, acompanha-nos a qualquer parte.
Não reivindica dia santo, nem domingo, nem feriado.
Não pede aumento, não faz greves,
aceita sem ciúmes que nos envolvamos com outros,
e jamais reclama se, porventura, o abandonamos.
Em caso de saudades, basta voltar a procurá-lo:
será tão agradável como foi da primeira vez,
e, mesmo que um pouco envelhecido,
terá conservado o conteúdo de outrora,
que nos tornará a deixar absorver sem pressa, sem mágoa,
imutável na capacidade que tem de nos fazer rir ou chorar.
 
Marcelino Lima 10/7/2001

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Balada para a moça com nome de flor (Barulho d'água)

Balada para a moça com nome de flor

 
Estou escrevendo uma nova canção para ti
Que mais do que fazer você dançar
Espero que faça você levitar;
Que mais do que fazer você sorrir,
Espero que faça você gargalhar;
Que mais do que fazer você relaxar,
Espero que faça você vibrar;
Que mais que fazer você curtir,
Espero que faça você amar.
Estou escrevendo uma nova canção para ti
Que evoque tua criança interior,
Que provoque a mulher que és, superior;
Que em cada nota te traga uma sensação única,
Diferente, abrangente, envolvente,
Que te faça umedecer e, de quebra, espero, deverá te aquecer
para, quando eu tocá-la, tu jamais me esquecer.
Estou finalizando esta canção para ti:
Que mais do que uma canção de amor,
Ela seja um hino em teu louvor...

 

sábado, 6 de outubro de 2012

Retrato 3x4 (Barulho d'água)

Retrato 3x4

Um forte sol, verde abacate, brilha em mais uma manhã. É dia 31 de fevereiro. O gato acorda de um longo cochilo e, ao se espreguiçar, abre as asas. O papagaio afia as unhas numa das vigas de concreto da varanda, enquanto o cão remedeia o mugido de um cavalo que nada ao lado do lago onde um pato pasta. Frenético, o galo persegue as rodas do carro passando pela estrada, um rato, simultanemte, expulsa a bicadas uma barata que invadira sua pocilga e tentava beber seu leite. Perto dali eclode da crisálida uma largatixa e, numa flor de 64 pétalas, há borboletas se alimentando de moscas. O lápis mágico do dono do sítio -- capaz de por no papel as novas cores que ele imagina --, registra cada cena na folha caída da última estrela -- que, agorinha mesmo, partira com a lua --, e vai assim pintando de todo aquele burburinho um fiel retrato 3x4...

Dois olhos (Barulho d'água)

Dois olhos


Em terra de cegos, quem tem um olho é rei. E quem tem dois mantém um na guarda do soberano, outro na porta do fundo do palácio... para vazar caso o surpreendam se divertindo com a rainha!

sábado, 8 de setembro de 2012

À sombra do ipê (Barulho d`água)

À sombra do ipê
 
Para achar onde moro, procure um ipê roxo.
Minha casa fica à sombra dele.
Quando  chegar aqui, não carece de bater palmas.
Nem de fazer soar a campainha:
As flores dele me avisarão que estás ao portão.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Ato de nobreza (Barulho d'água)

Ato de nobreza

Quem não é do bando de loucos ri, chora, esperneia, goza, zoa, berra, delira, sara, falta ao trabalho, fala a semana inteira, paga promessa, solta fogos, dá tiros para o ar, bebe e paga a conta do boteco para comemorar quando o Todo Poderoso é derrotado.
Quem odeia o maior campeão invicto das Américas de todos os tempos faz promessa, caridade, trabalho na encruzilhada, ponto na esquina, aposta, endivida-se, vende a mãe, chuta o cão, reza, jejua, deixa de beber, até larga quem ama para ver o Timão levar a pior.
Ah, pobres coitados são os que sofrem ou ficam radiantes,  perdem tempo em vão desejando nossa má sorte. O alvinegro do Parque São Jorge é grande demais para que eles o entendam ou possam secá-lo, e tão grande que jamais perde um jogo. Então você que é anti, se liga, aprenda, procure ser feliz de outro modo... ou pare de se entristecer e ter colapsos ou faniquitos! Aqui é Corinthians, mano, e este time jamais é batido: apenas pratica, de vez em quando, o nobre ato de deixar os adversários ganharem para que o futebol tenha alguma graça...

domingo, 22 de julho de 2012


Haicailinhas 2 (atualização em 2 de setembro de 2012)

Um dia destes comecei a buscar em caixas, gavetas e cedês fotos antigas para enriquecer meu álbum digital e, entre elas, resgatei também alguns textos e poemas, enre eles haicais, ou tercetos em forma de haicais. Nesta nova retranca para a série Haicailinhas estão alguns.

Marcelino Lima
 
Carro do queijo/para provar não paga./E pode ser com doce.
Toca nove vezes/O sino da capelinha --/O trem responde três.
Na quarta volta/já são três sapos cantando/na segunda curva.
Manhã de outono –/há três dias no varal,/o tênis pingando água...
Casa branca,/batentes azuis./À porta, marimbondos!
Casinha na periferia,/cana em ponto de corte/gatos no quintal...
Andorinha, andorinha:/mesmo não sendo feriado/vou passear à toa!
Em toda a casa,/só a cama dessarumada--/gatinha nas cobertas.
Ao colo do pintor,/o gato segue com os olhos/o vaivém do pincel.
Tarde de verão --/entre o voo de dois pardais,/ecoa um trovão.
Tarde chuvosa --/aos trovões misturam-se/sons de uma serraria.
Tarde chuvosa --/na rodovia, lá longe,/acendem-se as luminárias
Caixote de peras/com alguns cortes e tintas/casinha de tuim 
Em papel rosado/prediz um novo amor/a ave do realejo
De varal em varal/o cambacica vai pulando/até chegar ao néctar.
De cordão invísivel,/e pingente de estrela,/O colar da lua...
Sopa de estrelas--/cortado como a lua,/O pão que acompanha.
Uma folha cai--/à luz do sol, amarela,/quando gira, verde..
Vão aonde eu vou/não contam nada a ninguém--/ah, meus sapatos...
Meu velho sapato--/ainda guarda segredos/e não erra caminhos.
Em sonho, voo/ e, nos fios elétricos,/brotam cerejeiras.
Bem-me-quer, mal-me-quer.../o vento desfaz a nuvem/em forma de flor.
Como podes, gato,/divertir-se tanto assim/com um bago de uvas?
Clarão ao longe/leve batuque na janela--/ai vem chuva boa!
Grandes, amarelas./As pinhas da minha infância/não têm similares.
Rosa lá em cima./Lá embaixo, a molecada/esperando pinhas.
Quarenta caroços/e ainda está intacta/metade da pinha.
Buraco na parede,/ passa o ar, passa a luz .../...ai, ai de mim, menina!
Chuva violenta,/entre galhos e fios caídos,/salvou-se a violeta.
Noite de geada —/recados de namorados/no vidro do carro.
Sol de inverno--/Uma calçada repleta,/outra vazia.
Passeio de férias –/Caminho nas ruas da infância/agora de sapatos.
Tudo fica quentinho/onde ela se deita --/gata do Jorginho.
Ah, que viagem! --/ao descascar a laranja,/várias voltas ao mundo.
Estrelas e luas –/a noite, bem quentinhas,/num prato de sopa.
Kombi da pamonha –/tudo quieto, de repente,/no prédio em obras.
Mangueira frondosa --/com seus uis e ais,/prima maravilhosa!
Chuva passageira--/flores de jacarandá/no dorso do cavalo.
Até meu destino/ainda tem muito chão/ -- Ah, pé de goiaba!
Troca na cidade --/leva milho, traz café,/o carro de boi.
Os donos nem saíram,/mas os gatos já subiram --/e dormem na mesa!
Domingo de sol,/toda a família no gramado--/bando de pássaros pretos.
Na fonte da praça,/um mergulho, um voo curto.../bem-te-vi toma banho!
Chuva a caminho./Mesmo apertando os passos,/o vira-lata atrás.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Barulho d`água (Surpresa)


Surpresa




Não demorou muito para o menino juntar-se ao famoso bruxinho e ao casal de parceiros deste naquela manhã em que acordara determinado a vencer o medo e, com ajuda dos três, a descobrir por que cargas d água havia tantos barulhos no quarto dos pais. A porta sanfonada, às vezes, chacoalhava, aumentando o mistério e o pavor que sentia. Na versão do pai tratava-se apenas da ação do vento, responsável também pelos zumbidos que o piá ouvia e atribuía a um monstro dos mais escabrosos – daqueles verdes e gosmentos, com diversos olhos e bocarras, chifres a se perder a conta e outras características assombrosas. Esta explicação já fora dada mais de trocentas vezes, mas não adiantava: o moleque estava convencido de que os sons eram grunhidos de uma fera faminta, pronta a devorar quem ousasse penetrar naquele covil. Ah, mas em poucos minutos poria tudo à prova naquela heróica expedição, descobrindo com os próprios olhos quem estava certo, pensava alto, enquanto o quarteto avançava. Depois de a garota bradar um feitiço que fez abrir as enferrujadas trancas da porta, os quatro penetraram na floresta proibida ignorando os avisos para não irem em frente, embora tomando o cuidado de prosseguirem cobertos pela capa de invisibilidade em que se transformara um dos lençóis da casa. Xerox, gato siamês cópia fiel da mãe, reforçava o grupo segurando-se para não soltar um miado de pânico e aguentar as pontas mesmo depois de levar um pisão daqueles. Passo a passo, no escuro, sob ruídos de enregelar as espinhas, rumaram em direção à cama -- ou melhor, à escura caverna de onde deveriam provir os roncos que pareciam ainda mais fortes naquela manhã. Falando baixinho, combinaram só tirar a capa quando estivessem frente a frente com o bicho, paralisando-o depois de lançarem direta e simultaneamente os fachos das lanternas contra os olhos dele; um dos guris, o de cabelos ruivos, ponderou que os tiros poderiam sair pelas culatras se o ogro possuísse mais de quatro, observação que, como de costume, levou a sagaz mocinha a intervir para tranquilizá-los após jurar conhecer outra palavra mágica capaz de paralisar animais de quaisquer porte e natureza. Sentiram a tremedeira aumentar, mas chegaram confiantes, enfim, ao objetivo. Era a hora de agirem! Num gesto decidido, o menino removeu a capa! Quando descobriram que o motivo de tanto medo resumia-se a um inofensivo e simpático dragão de brinquedo (o mesmo que o filho vira à venda numa loja descolada e o qual a mãe prometera comprar quando tivesse grana) todos caíram na gargalhada, principalmente depois que o bichano cismou em cheirar o cuspidor de fogo e saiu com os bigodes chamuscados. Exultante com o achado, mais do que depressa o menino colocou os quatro bonecos numa sacola e saiu correndo do quarto para apresentar o novo amigo à vovó. Ainda teve tempo de notar ao deixar o local que o vento, entrando pela janela aberta, não só fazia a porta gemer, bem como enfurnava as cortinas, deixando-as como se estivessem grávidas...

                                                                   


domingo, 17 de junho de 2012

Barulho d`água (Algo especial)

Algo especial

Um gato é algo especial.
Ou um cãozinho. 
Gol do time do peito. 
Contar estrelas em céu de outono. 
Ouvi-las. 
Acordar mais tarde.
Abrir a janela.
Bem-te-vi na antena.
Comer pipoca de quermesse.
Juntar paus no mato.
Acender a lareira.
Ou o fogão de lenha para cozinhar arroz.
Descarregar linha de pipa.
Tomar chuva.
Caminhar, descalço, pela praia.
Lavar a cabeça na bica.
Preparar a terra no vaso.
Trocar as flores à janela.
Alimentar peixinhos.
Um par de chinelos velhos.
Ler Quintana.
Receber Basho.
Cinema sábado.
Fazer aniversário.
Ter escolhas.
Deixar marcas.
Tornar-se imprescindível.
Ser você!

domingo, 1 de janeiro de 2012

Três ou mais linhas de prosa... e de poesia


O velho lago
mergulha a rã--
barulho d´água.

Este blog, cujo nome deriva do haicai de Matsuo Bashô, tem por objetivo a divulgação de crônicas e outros gêneros literários de minha autoria -- consulte também
http://www.poesiafeitaemcasa.blogspot.com e http://www.karumi.nafoto.net, outros trabalhos que assino. A cópia e reprodução dos elementos aqui contidos sem a devida autorização, por escrito, e sem estarem negociados direitos autorais e outras questões comerciais, sujeitarão o infrator a entendimentos com a lei.

Marcelino Lima



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