Descoberta
Observo
o peixe em incansável singrado, centenas de vezes, do fundo à tona da linha de
superfície do aquário, sempre tão fluído e tão plácido quanto à água com a qual
convive. Vez por outra ele estaciona e um ponto ao acaso, e, junto ao vidro, dando
uma pausa no vaivém, também me manja. Até que, passados alguns instantes desta troca de
olhares, percebo empatia mútua, em suas pupilas há um quê qualquer que faz dele
mais do que um bicho -- um delicado ser que, voltando segundos antes desta descoberta,
sequer era de estimação, apenas ocupava há meses e quase despercebido um pote
em um canto da sala.
Intrigo-me, não sei ao certo e me pergunto a fundo, embora eu já desconfie: qual seria este sentimento?
Intrigo-me, não sei ao certo e me pergunto a fundo, embora eu já desconfie: qual seria este sentimento?
Aceito
esta impressão e considero-a como válida. Apago o cigarro, a luz, vou me deitar:
a noite desta terça-feira de maio açoita as venezianas com seu vento frio. O peixe de brilhantes escamas azuis com tons púrpura fica lá, em seu aquático
mundo, insone, sereno. Rumo à cama acompanha-me forte sensação: sobre a
cantoneira da sala, vivendo feliz, há um velho-novo amigo dentro do recipiente que
removerei, cuidadosamente, para o centro da mesa, ao qual, a partir de amanhã,
terei de passar a desejar bom-dia...
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