sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Barulho d´água (O fim)

O fim
Amou pela última vez nem sabe quando. A traição da mina não sai da cabeça dele, literalmente. Perdeu o melhor amigo baleado numa emboscada. O intrujo dançou na mão da "Cinza", não dá mais para fazer aquelas lanças. Para piorar, a grana do bico na obra continua promessa (“Será que estão me enrolando?”). O derradeiro cigarro do maço virou bituca, se der o trocado no paratodos não o terá para o de comer. Ou para aquele trago (“ou pra marola...”). A noite está chegando (“Esta garrafa só tem meia dose!? Será que estão me roubando?). A barriga ronca repetidamente, e o seu Zé da quitanda anda esperto, não aceita pendurar mais nada. A noite está chegando. Dico Ratão já mandou o recado (“Ou paga ou morre, tá jurado, corno!"). Os home tão dando direto geral no bairro (“Será que aquele filho da puta me caguetou?") O calor juntando moscas, lixo amontoado nos cantos. O NP sobre a mesa manchetando crime passional (“Sem vergonha, mereceu os pipocos na cara, puta, mulher à toa!"). O coração perguntando: com quem estará Suzana? A noite já caiu, é tarde, no copo a dose, agora, é imaginária. Um zumbido corta a rua (“Sirene? Talvez, será?”), estampidos rompem de novo a solidão até então só burlada pelo chilrear de um grilo ("Nova vingança, talvez... será que estão me chifrando? Hum, e se deram meu barraco?") Passos apertados e apressados nas imediações. Cães latindo, nervosos. Tremedeira. Delírio. Olhos fechados, um corpo ( “ahhhh,, Suzanaaaaa, huummm, não, não vou pagar aquele rato, que ele se foda!, Teresa, hum, hum, hã, hã, Suzanan, Suzanan, ai, ai, filho da puta, eu é que vou te dar baixa, Suzanan, ai, ai, Suzanan, ah, hã, hã, aaaaaaahhhh, ai, ai, ai, ai, portuga sovina, enfia no rabo tua ... Suzana, ai,ai tesão, quitanda de merda, gostosa, gostosa, cachorra, potra, aaaah, hummm, babacas, aaaahhh...) Um leve choque, breve arrebatamento, alívio... Vazio... Violentas batidas na porta, taquicardia... A garrafa vazia. O maço de cigarros vazio. A carteira vazia. A alma vazia, mas em enlevo, no tambor, só uma bala. Novo estampido. A arma, agora, também vazia...

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Três ou mais linhas de prosa... e de poesia


O velho lago
mergulha a rã--
barulho d´água.

Este blog, cujo nome deriva do haicai de Matsuo Bashô, tem por objetivo a divulgação de crônicas e outros gêneros literários de minha autoria -- consulte também
http://www.poesiafeitaemcasa.blogspot.com e http://www.karumi.nafoto.net, outros trabalhos que assino. A cópia e reprodução dos elementos aqui contidos sem a devida autorização, por escrito, e sem estarem negociados direitos autorais e outras questões comerciais, sujeitarão o infrator a entendimentos com a lei.

Marcelino Lima



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