quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Barulho d´água (Chácara)

Chacára
A velha senhora que acenava triste debruçada no batente da janela chorando a despedida e mostrando o peito de seios magros há muito ficou para trás da curva do moinho. Seguindo em frente foram se abrindo as porteiras para a grande estrada. Na bagagem trazia-se cana, queijos e doces, broas e sabão de cinzas, panos rotos, pedaços de camisas , sacos de farinha puídos, toscas toalhas para secar o rosto após o banho de gato à margem do regato ao pé do cemitério de poucas e brancas cruzes. A casa de pau a pique resistiu heróica, valente, como fora outrora a aposentada jardineira azul -- agora uma moldura no imaginário -- que tantos morros cortou, sobe e desce, sobe e desce quilômetros a fio engasgando com a vermelha poeira do sertão, simbolo de uma era já superada pelo asfalto e por parabólicas que trazem imagens longínquas, matando a hora do terço, o tempo de colher laranjas. O bambuzal, outro remanescente, permanece intacto, estala fazendo duo com o canto da siriema. Com um pouco de sorte, ainda pode-se pegar um bicho-de-pé. Mas é preciso ser rápido: o esquecimento é veloz como Pentium e as lembranças fugazes como sábia que pousa em mourão..

Nenhum comentário:

Três ou mais linhas de prosa... e de poesia


O velho lago
mergulha a rã--
barulho d´água.

Este blog, cujo nome deriva do haicai de Matsuo Bashô, tem por objetivo a divulgação de crônicas e outros gêneros literários de minha autoria -- consulte também
http://www.poesiafeitaemcasa.blogspot.com e http://www.karumi.nafoto.net, outros trabalhos que assino. A cópia e reprodução dos elementos aqui contidos sem a devida autorização, por escrito, e sem estarem negociados direitos autorais e outras questões comerciais, sujeitarão o infrator a entendimentos com a lei.

Marcelino Lima



Marcadores

Arquivo do blog