quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Barulho d´água (Mercado Municipal)

Mercado Municipal
O silêncio subitamente tomou conta do Mercado Municipal. Ninguém combinara, não houve acordos neste sentido, muito menos simulação ou treino, mas com uma perfeição de orquestra filarmônica bem afinadinha, como se tudo estivesse organizado, de repente nada mais era dito, nem um som ouvido. Nem uma mosca parecia zunir. E olha que era dia de peixe fresco, quando a muvuca aumenta e, em consequência, o burburinho sobe na escala dos decibéis a ponto de ouvidos e porcelanas quase se trincarem. Talvez apurando bem a audição até pudesse ter sido possível captar o estalar dos grampos de aço se desprendendo voluntariamente das emendas das caixas de frutas, o croc-croc de uma larva mastigando uma folha de alface, o sussurrar dos sacos de feijão, o assovio malicioso de um cravo para uma rosa e outros barulhinhos e ruídos sequer suspeitados, mas que ocorrem ali, em universos menores e particulares, todo santo dia.
O hiato, entretanto, durou apenas alguns segundos. Antes mesmo que alguém que estivesse a contar chegasse a cinco, o tonitruar das centenas de vozes misturado ao trança-trança pelos corredores reeclodiu, inundando o tempo e o espaço entre os boxes como sempre, enchendo de novo o ambiente de zoada. A luz do sol, naquele instante, vazava os vitrais e projetava belos afrescos num dos lados do Mercado. No ar, ao invés da repentina quietude, ficaram aromas como o de um pastel de banana com canela sendo frito.

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Três ou mais linhas de prosa... e de poesia


O velho lago
mergulha a rã--
barulho d´água.

Este blog, cujo nome deriva do haicai de Matsuo Bashô, tem por objetivo a divulgação de crônicas e outros gêneros literários de minha autoria -- consulte também
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Marcelino Lima



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